SEXO COM AMOR E COMPROMISSO
Sendo já um veterano dos Alcoólicos Anónimos, uma vez que deixei de beber álcool há 25 anos, comecei a minha recuperação sexual há apenas 4 anos numa irmandade paralela, que à semelhança de SRA também trata de adição ao sexo. O impacto de ter parado de me masturbar e de ter entrado em abstinência total durante algum tempo, fez-me sentir verdadeiramente sóbrio pela primeira vez na minha vida, uma vez que usava o sexo como se fosse uma droga. No entanto estando numa irmandade que me dava liberdade total para conceber a minha própria sobriedade sexual, depressa a minha mente doente começou a racionalizar o meu comportamento sexual e embora tenha deixado vários padrões de adição ao sexo para trás, houve dois que não consegui deixar totalmente: A masturbação e o sexo casual. Resolvi incluir estes dois comportamentos na minha definição de sobriedade. Como adito ao sexo percebi que a minha mente pregava-me partidas quanto ao meu comportamento sexual, justificando comportamentos aditivos como comportamentos saudáveis. Percebi assim que não podia ser eu próprio a definir a minha sobriedade, uma vez que o meu juízo não era claro. A minha doença cegava-me. “Uma mente doente não pode tratar uma mente doente.” Se eu era parte do problema não podia ser em simultâneo parte da solução. A solução tinha que vir de fora e não de mim próprio.
Há uns meses atrás resolvi pedir ajuda a outras irmandades nos Estados Unidos que também tratam de adição ao sexo e que têm uma conceito de sobriedade mais restrito, entre as quais os “Sexual Recovery Anonymous” (SRA) que têm um conceito de sobriedade claro: Abstinência de todo o tipo de sexo fora de uma relação de compromisso mútuo, inclusivamente de masturbação. Conceito com o qual me identifico totalmente. Percebi que querer controlar a masturbação ou o sexo casual seria o mesmo que como alcoólico, abster-me apenas das bebidas brancas e tentar controlar o consumo de cerveja ou vinho, o que não faria nenhum sentido. Este novo conceito de sobriedade permitiu-me assim ter uma atitude mais honesta comigo próprio. Posso ter recaídas em masturbação e sexo casual mas encaro-as por aquilo que elas são: Recaídas. E não tento justificar o injustificável, procurando sempre o meu ideal de recuperação.
A criação de Recuperação Sexual Anónimos em Portugal veio assim dar resposta aos aditos ao sexo, que como eu, reconhecem a sua incapacidade para controlarem os seus comportamentos sexuais compulsivos fora de uma relação de compromisso e que procuram restringir a sua sexualidade ao sexo íntimo numa relação de amor.
SEGUNDA OPORTUNIDADE
Não estou há muito tempo em recuperação mas já percebi que muitos anos da minha vida foram conduzidos sem qualquer controlo. A ansia de alimentar a minha adição e o consumo de álcool desregrado, arrastaram-me para um caminho de dor, vergonha, sofrimento e mais palavras poderia juntar ao que foi viver esta doença.
Felizmente, tive alguém que ainda acreditou que me poderia salvar e mostrou-me o caminho que tinha de seguir.
Depois de muita procura, aderi a uma irmandade paralela a SRA e assim que entrei encontrei a minha atual madrinha que logo se disponibilizou para orientar a minha recuperação. Reuniões, um minucioso trabalho de passos que ainda estou a trabalhar, muita coragem para remexer no degradante passado e honestidade, que para mim é o maior alicerce, produziram resultados, uma vez que estou uma pessoa completamente diferente.
Os meses de sobriedade fizeram-me sentir mais serena, ter consciência do que faço e qual o rumo que quero tomar na minha vida.
Aqui em SRA existe o conceito de sobriedade que procuro: Ter sexo apenas dentro de uma relação de compromisso ou ter sexo com sentimento.
O sexo agora já não manda em mim, pois já não sou dependente dele e o meu Poder superior controla-me e guia-me.
Em suma é assim que quero viver, LIVRE desta ADIÇÃO.
UM TESTEMUNHO DA MINHA RECUPERAÇÃO
A minha recuperação iniciou-se há cerca de três meses. Fui apanhado na teia de mentiras e de enganos em que todos os aditos se enleiam. Menti e enganei não só aos outros como a mim próprio, até mais a mim próprio.
Cheguei a esta irmandade, e a outra irmandade paralela, não por mim mas porque fui empurrado pela pessoa que mais tinha enganado durante tanto tempo, hoje sei que foi a coisa mais importante que esta pessoa fez por mim. A minha recuperação ainda está no principio, não procuro a cura mas um caminho para me compreender melhor e conseguir entregar ao meu Poder Superior a minha vida, deixá-lo fazer o que eu não consegui fazer sozinho: parar o uso, estar sereno e ser honesto. Um dia de cada vez.
É incrível o poder da partilha, do companheirismo e, mais importante ainda, do programa dos Doze Passos. Ainda estou no primeiro passo, mas já sinto os efeitos profundos na forma como vejo o mundo, como sei que não vale a pena pensar que tudo posso controlar ou mudar. O sexo dominava a minha vida, destruía-a com o meu acordo relutante. Tantas vezes pensei que ia parar, mas não parava... racionalizava tudo para justificar só mais uma vez... só mais esta vez.
Estou em abstinência total desde o início da minha recuperação, o que antes parecia impossível acontece hoje naturalmente, com trabalho também porque não há uma poção mágica tomada num trago só que substitua o trabalho dos Doze Passos. Todos os dias, um dia de cada vez.
O CAMINHO PARA A LIBERDADE
Foi cedo na minha adolescência que descobri a pornografia e senti o poder desse comportamento como um alcoólico que toma a primeira bebida. Durante alguns anos consegui funcionar com esse hábito na penumbra das minhas noites. Era um aliviador de stress. Uma bengala para conseguir lidar com o dia a dia. Durante esse período usei todo o tipo de racionalizações para justificar o meu uso de pornografia e masturbação – todos os homens o fazem, tenho uma grande libido... - mas a verdade era que eu não partilhava este hábito com ninguém. Era um segredo do qual tinha vergonha e simultaneamente poder: era o meu segredo!
Quando as coisas começaram a descambar, eu pensava que estava simplesmente deprimido e disso me convenci, apesar de já aí ter começado a sentir que estava a perder demasiado tempo do meu dia a dia com pornografia e masturbação. Já não tinha energia suficiente para trabalho, estudos ou relações pessoais. A vida parecia gradualmente deixar de fazer sentido. Foi nesse momento que pesquisei na Internet sobre adição ao sexo e, ao responder a vários questionários de diagnóstico, percebi que eu tinha todos os traços de alguém profundamente viciado em pornografia. O que fazer então? Foi aí que grupos de 12 passos como SRA entraram na minha vida.
Ao começar a ir a reuniões, arranjar um padrinho e, sob a direção dele, trabalhar os 12 passos, comecei pela primeira vez na minha vida a sentir-me livre, um dia de cada vez, de comportamentos aditivos. Em SRA e noutras irmandades de 12 passos, eu encontrei um novo modo de vida, no qual nunca mais precisarei de voltar ao caos e à destruição da adição. Gradualmente, as minhas feridas psicológicas e emocionais vão sarando, tal como as minhas relações pessoais e o meu percurso profissional. Nestes grupos encontrei paz e estabilidade. Devo a minha vida a eles.
AS FACES DA ADIÇÃO
A minha primeira obsessão foi talvez a relação doentia dos meus pais. O meu pai era alcoólico e desde criança que me lembro de estar constantemente preocupado pela chegada dele a casa, pois se tivesse usado sabia que ia haver conflito entre os meus pais. Na minha adolescência esta relação marcou-me muito e tornou-se o centro das minhas vivências, marcada pela dificuldade em me libertar destas preocupações e por dificuldades de integração.
Depois veio a descoberta da masturbação, que rapidamente se tornou compulsiva, libertando-me um pouco das preocupações para as substituir por luxúria. Mais tarde conheci o álcool e as drogas. As drogas tornaram-se no meu novo modo de vida. As preocupações do passado desapareceram. As minhas críticas ao uso do meu pai deram lugar à critica pela postura da minha mãe, que, na minha nova visão, não se sabia divertir nem permitia que outros o fizessem.
Com o tempo, o divertimento deu lugar à compulsão e ao desespero. Depois de ter tentado por todos os meios controlar o meu uso, sem sucesso, conheci a irmandade de NA e fui para tratamento. Há mais de 25 anos que deixei as drogas. A minha vida transformou-se através dos 12 passos. A obsessão pelas drogas desapareceu e hoje, muito raramente, me lembro de drogas e ainda mais raramente tenho vontade de as usar. Mas ao longo destes 25 anos a minha adição foi ganhando outros contornos.
Na realidade, quase desde a minha entrada em recuperação pelo uso de drogas que comecei a procurar outras formas de “alívio” e busca do prazer imediato. Pela primeira vez frequentei prostitutas e visualizei pornografia, por vezes de forma compulsiva e obsessiva. Durante muitos anos fui-me mantendo abstinente de drogas, mas a minha adição sexual foi progredindo. Recusei-me muitas vezes a admitir a minha impotência perante esta nova forma de adição. Até que o rastro de consequências ganhou dimensão e era impossível ignorá-la.
Ao longo destes anos fui tentando pedir ajuda, mas faltava-me a identificação. Frequentava as reuniões de outras irmandades, mas não conhecia ninguém em recuperação sexual. Até que, em tempos de pandemia, descobri as reuniões de SRA online. Nelas encontrei o poder da identificação e da partilha de experiências semelhantes.
Só por hoje quero viver livre de todas as formas de adição e, com a ajuda dos meus companheiros, escolher o caminho da recuperação.